sábado, 23 de fevereiro de 2008

História

Introdução
Iniciando o curso de Direito Empresarial - ou Direito Comercial, como prefere a doutrina tradicional -, vamos conhecer um pouco da história deste ramo do Direito, que passa por momento de instabilidade após diversas alterações legislativas.

Embora o Império Romano tenha presenciado a prática reiterada de atos de troca, não é possível reconhecer um direito especializado na regulamentação das matérias e assuntos relacionados ao comércio. Historiadores relatam, entretanto, momentos que é possível verificar a solução de disputas relacionadas aos atos comerciais. O mais importante consistia no esquartejamento do devedor que perdia o controle de seus débitos. Desta forma, o grupo de credores atribuía para si o direito de esquartejar, cortar o devedor aos pedaços, dando a cada credor o direito de receber uma parte do devedor proporcional ao tamanho da dívida.

Apenas a título de curiosidade, segundo a mitologia, a alma de qualquer indivíduo não descansa enquanto o corpo não for enterrado. Desta forma, o esquartejamento obrigava a família do devedor morto a "comprar" seus pedaços a fim de uni-los, e garatir um enterro.

Com o advento da Lex Poetelia Papiria em 428 a.C., foi possível separar o direito ao patrimônio do direito à vida, de forma que o devedor passa a responder unicamente com o total de seus bens, impossibilitando, desta forma, o pagamento da dívida com a própria vida.

Ressalta-se que, na época, havia duas formas de aplicação do direito: o jus civile, que somente era aplicado aos cidadãos romanos (e portanto, era utilizado para regular as relações comerciais nacionais) e o jus gentium, que era aplicado a todos os cidadãos do mundo, e, por via reflexa, aplicado nas relações comerciais internacionais.

Na Idade Média, mais precisamente no século XII é possível verificar a existência de alguns contratos comerciais, entre eles, o foenus nauticus, relacionados às expedições de navios em busca de produtos do exterior. Os grandes mercados existentes na Itália favoreceram a criação de um Direito Comercial, ainda que bastante rudimentar. Neste momento histórico, deve ser lembrada a existência da bancarrota, que consistia em um "direito" de quebrar o estabelecimento do devedor (quando não o próprio devedor), pertencente ao grupo de credores que, após deliberação, verificava a impossibilidade de pagamento do débito.

Com o desvio das grandes negociações da Itália para a França, verificou-se o surgimento das Corporações de Ofício (guildas), nas quais um grupo de comerciantes atraía para si o direito de dizer quem poderia exercer a mercancia. Estes órgãos exerciam o poder de fiscalização, normatização e julgamento de causas que envolvessem comerciantes, ainda que a outra parte fosse um particular. Este é o primeiro momento do Direito Comercial, podendo assim, ser denominado Período Subjetivo Corporativista, porque comerciante era aquele sujeito (subjetivo) autorizado pela guilda (corporação) a exercer a mercancia.

Os burgueses, nesta época, exerciam o comércio de forma ilegal, porque não eram autorizados pelas guildas. Além disto, havia uma grande repulsa pelo governo da época em relação aos burgueses, de forma que uma revolução iluminista era esperada.

Com a ascenção de Napoleão ao poder, apoiado pelos burgueses, surgem, a partir do ano de 1804, vários códigos jurídicos. A História dá conta que o próprio Napoleão participou da produção legislativa, tendo, em 1808, elaborado o Código Comercial, o primeiro sistema comercial organizado do mundo. A partir deste código, deixa de existir as Corporações de Ofício, uma vez que comerciante passa a ser aquele que simplesmente pratica qualquer ato considerado comercial. É a chamada Teoria dos Atos do Comércio. Desta forma, para verificação da condição de comerciante, basta que se verifique se o indivíduo pratica determinado ato arrolado como sendo um ato de comércio. E é por este motivo que chamamos este segundo momento de Período Objetivo.

O Código de Napoleão foi copiado por diversos países cujo direito é baseado na cultura romana. Embora o Brasil não tenha adotado expressamente a teoria dos atos do comércio, o primeiro Código Comercial Brasileiro (Lei 556), elaborado em 1850, identifica o comerciante como aquele que pratica a mercancia com habitualidade.

Esta lei, entretanto, carecia de uma complementação, pois era necessário listar quais atos eram considerados mercancia. No mesmo ano, então, surge o Regulamento 737, que no seu art. 19 informa o que poderia ser considerado comério.

O comércio, entretanto, é matéria que se desenvolve dia a dia, sendo que já em 1875 a lista de atividades era precária e insuficiente, sendo revogado, neste ano, o regulamento. A partir deste instante, o art. 19 do Regulamento 737/1850 era apenas exemplificativo, e embora revogado, servia como modelo para verificação da mercancia. Apenas a título de exemplo, cite-se que as atividades relacionadas à venda de imóveis (imobiliárias) e prestação de serviços não estavam incluídas no rol, de forma que não era possível reconhecer o comério, na acepção jurídica, nestas atividades.

A teoria dos atos do comércio, para continuar existindo, necessitaria de uma atualização paulatina, de forma que a cada ano seria necessário um remendo a fim de incluir novas atividades que poderiam ser considerados atos de comércio.

Em 1942, a Itália aprova o novo Código Civil, incluindo em seus artigos toda a matéria referente às empresas e ao direito do trabalho, unificando, desta forma, o direito privado. Neste código, positiva-se o direito de empresa, deixando de lado o conceito de ato de comércio, passando a ser adotada a pessoa do empresário como objeto de estudo do Direito Comercial. Esta nova projeção do direito acaba por alterar inclusive o nome da matéria, que passa a ser Direito Empresarial, já que o empresário se torna o centro do estudo da matéria. É o terceiro momento, chamado de Período Subjetivo Moderno, que adota a Teoria da Empresa.

De acordo com o jurista italiano Alberto Asquini, que vivenciou o surgimento desta teoria, a empresa é um "fenômeno jurídico poliédrico, o qual tem sob o aspecto jurídico não um, mas diversos perfis em relação aos diversos elementos que ali concorrem".

Para Asquini, era possível identificar quatro perfis de empresa. O primeiro era o perfil subjetivo, de forma que empresa é a pessoa que "exercita profissionalmente atividade econômica organizada com o fim da produção e da troca de bens ou serviços."

O segundo perfil, chamado funcional, confunde-se com o próprio conceito de atividade empresarial, podendo a empresa ser considerada uma força dirigida a um determinado objetivo capaz de gerar bens ou serviços.

Pelo perfil objetivo ou patrimonial, a empresa é considerada como um conjunto de bens, que se destina à atividade empresarial (finalidade específica).

Por fim, o quarto perfil, chamado corporativo, pelo qual a empresa seria um núcleo organizado em função de um fim econômico comum, ou seja, ambas as classes, operários e empresários, visavam a formação de um equilíbrio de forças.

A Teoria da Empresa foi adotada pelo Código Civil de 2002, que, a exemplo do Código Italiano, incorporou as matérias empresarias, ainda que tenha deixado de lado algumas leis específicas, como a lei do Cheque, lei de Locações Comerciais e Lei das Sociedades Anônimas.

Pelo art. 966 do Código Civil Brasileiro, considera-se empresário quem exerce profissionalmente atividade econômica organizada para a produção ou circulação de bens ou serviços.